✨ O FIM DA MÁSCARA DA CIVILIDADE
Por Bruno Stael
Houve um tempo em que a ideia de "crise civilizatória" parecia uma âncora. Um alarme. Algo que se anunciava com tom solene nos editoriais dos jornais sérios, nas falas dos especialistas, nos desabafos de artistas exaustos. Era 2018. Era o Brasil. Era o mundo. E parecia, de fato, que algo havia desmoronado de vez.
Mas o tempo passou. E com ele, a compreensão de que talvez... apenas talvez a tal crise civilizatória nunca tenha sido uma exceção. Talvez ela seja, na verdade, a condição permanente daquilo que chamamos civilização. Chega do mito da exceção histórica.
Porque quando, exatamente, a humanidade não esteve em colapso?
O império romano, celebrado como berço da civilização ocidental, foi também um berço de guerras ininterruptas, escravização, colonização e genocídios culturais. O Renascimento, com toda sua arte e beleza, coexistia com a caça às bruxas e massacres de povos não cristãos. A ‘modernidade’ trouxe tecnologias, sim — mas também trouxe a exploração industrial, os campos de concentração, as bombas nucleares.
E o mundo pós-”guerras mundiais”? Bom... ele só terceirizou suas guerras. Transferiu o horror para as bordas do mapa.
O que mudou, então? Talvez apenas a ilusão. O verniz. A máscara. Essa tal “crise civilizatória” de 2018 pra cá — que muitos enxergaram como o grande abismo — é, na real, só mais uma dobra do abismo que já está debaixo dos nossos pés há séculos.
A máscara da civilidade.
Essa máscara que chama devastar de "desenvolver". Essa máscara que chama explorar de "gerar riqueza". Essa máscara que chama censura de "liberdade de opinião". Essa máscara que protege os rostos de quem pode pagar para não sangrar. E o mais perverso é que esse colapso foi muitas vezes transformado em progresso, em civilização, em desenvolvimento — pra quem? Pra meia dúzia, enquanto o resto sangra.
Mas a máscara está caindo. Aos poucos. Em pedaços. Em falhas de narrativa que não se sustentam mais.
Como disse Fernanda Montenegro (por meio da boca de sua filha, Fernanda Torres): "o mundo sempre esteve para acabar". E talvez esse seja o ponto. A humanidade vive com essa sensação constante de fim, porque o fim é uma linha de chegada que se move junto com a gente.
Não é o fim do mundo. É o fim da máscara do mundo. A verdade é que a barbárie (mascarada de civilidade) não é uma anomalia: é um método. O que é uma crise civilizatória, senão o colapso de uma ilusão de ordem que nunca foi universal? Talvez não estejamos vivendo o fim da civilização, mas o fim da máscara de civilidade.
E quando a máscara cai, não resta muito à civilização além de encarar seu próprio rosto. Não o que gostaria de ter. Mas o que realmente tem.
Entre o colapso e a reconstrução, talvez reste a pergunta:
— E se não for uma crise? — E se sempre foi assim? — E se o real começa no momento em que a mentira se desfaz?
Talvez o Devaneio esteja aqui para isso. ✨ Talvez o Jornal do Devaneio exista justamente nesse espaço entre o delírio do progresso e o desvelamento da barbárie. Entre o “sempre foi assim” e o “precisa deixar de ser”. ✨ Não para prever o fim. Mas para acompanhá-lo com olhos de quem sabe que onde acaba um império, começa uma lenda.
Ou, quem sabe, um novo mundo.
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Mas que novo mundo será esse?
Se ainda houver esperança — e talvez haja —, ela não virá dos algoritmos nem dos tiranos de terno. Virá de um outro pacto: o da democracia solidária, da escuta radical, da reconstrução coletiva dos direitos, da recusa ao individualismo como religião moderna.
Enfrentar o neoliberalismo e suas ideologias radicais não é mais uma escolha — é uma necessidade histórica.
E talvez, no fim das contas, a pergunta mais urgente não seja sobre o fim da civilização. Mas sobre como construir uma que, enfim, mereça esse nome.
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