📜 A MARAVILHOSA ARTE DE AFUNDAR NA PRÓPRIA INVENÇÃO
Ou como Gutenberg criou a imprensa, revolucionou o mundo, e terminou como mais um romântico falido
No Natal de 1438, Andreas Dritzehn morreu de peste e deixou duas coisas: um rastro de dívidas e um processo judicial que, honestamente, merecia virar minissérie na HBO.
Dritzehn não era qualquer um. Era sócio de um empreendimento misterioso que produzia espelhinhos mágicos (capazes de absorver o “resplendor divino” — ou seja, selfies místicas da Idade Média), e também… algo mais. Algo grande. Algo secreto o suficiente para render uma disputa judicial com termos como “arte oculta” e “remover as peças da máquina antes que descubram do que se trata”.
Era praticamente um NDA medieval — também conhecido como acordo de não divulgação, só que selado com cera quente e medo de bruxaria.
No centro da trama estava um certo Johannes Gensfleisch zur Laden zum Gutenberg — mais conhecido por seu nome artístico: Gutenberg, o Inventor que Quebrou.
Sim, o homem que democratizou o conhecimento e fez as letras dançarem no papel era, ao mesmo tempo, um ourives genial e um empresário desastroso. Enquanto seus contemporâneos imprimiam indulgências, panfletos anticlericais e cartilhas escolares a rodo, Gutenberg gastava fortunas para imprimir a Bíblia mais bonita da história. Resultado? Glória póstuma. E boleto vivo.
Sua invenção foi mais do que uma prensa: era um sistema completo de produção tipográfica. Um ritual industrial que envolvia punções, moldes, ligas metálicas, tintas a óleo e um bom punhado de delírio técnico. Gutenberg sonhava alto — e como todo visionário sem investidor-anjo, foi tragado pelo próprio ideal.
Enquanto ele testava seu protótipo com um livrinho escolar de 28 páginas (provavelmente lido por ninguém), o mundo começava a virar. Livros deixaram de ser relíquias monásticas e passaram a custar menos do que um jantar decente. O conhecimento escorreu das prateleiras dos mosteiros e vazou para feiras, praças e becos — onde ideias são perigosas e leitores, ainda mais.
O HOMEM DO MILÊNIO (QUE NÃO CONSEGUIU PAGAR OS BOLETOS)
Séculos depois, a British Library decidiria chamá-lo de “o homem do milênio”. E, com todo respeito aos concorrentes (que inventaram a anestesia, a internet ou o pão de queijo), talvez Gutenberg mereça mesmo o troféu.
Mas é preciso dizer: até mesmo o homem do milênio morreu sem conseguir monetizar seu conteúdo.
Gutenberg passou boa parte da vida perseguindo o sonho de imprimir bíblias gloriosas, dessas que brilham mais que a pele de Edward Cullen ao sol. Era uma obsessão artística. Uma aposta romântica num mundo que já dava sinais de que preferia panfletos sensacionalistas, gramáticas escolares e recibos de indulgência papal.
E enquanto ele imprimia o sagrado com tinta à base de óleo e amor não-remunerado, o capitalismo afinava suas garras.
Em 1455, o mesmo ano em que o futuro Papa Pio II babava com a nitidez das letras, Gutenberg enfrentava um novo processo judicial.
Resultado? Perdeu o controle da própria invenção.
A prensa, o sistema, o sonho tipográfico — tudo levado.
Era como se Tesla perdesse a eletricidade para o síndico.
Talvez, se tivesse se limitado a imprimir gramáticas escolares (o equivalente medieval aos cursos online), hoje ele estaria num mausoléu com wi-fi. Mas não. Gutenberg quis mais. Quis beleza, quis revolução, quis fazer arte com tipos móveis e tinta preta.
E o mundo, como sempre, respondeu: “isso dá lucro?”
Bem… Gutenberg morreu pobre. O que, convenhamos, é uma espécie de selo de autenticidade artística.
Inspirada na matéria da BBC: Por que a invenção da imprensa por Gutenberg o levou à ruína - BBC News Brasil
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